
"vejo o vento, atiçando a alma das árvores, empurrando nuvens, lavando o céu - mas não o sinto. tu encolhes o pescoço no casaco para te defenderes dele. [...] persigo-te para que o tempo exista. porque andas, e olhas o céu, e o encontras às vezes negro, ou cintilando como um escuro mar de jóias, ou chuvoso, ou ressequido de sol, sei que os dias passam. "
mesmo sem te ter (ainda) tocado, faltas-me. persigo-te.... ou ao que de ti vejo, anseio, interpreto nas nuvens de um ou outro céu. nas folhagens claro-escuras de determinada árvore. nos pequenos detalhes que se enrodilham nos meus olhos ao sair de casa. nos pormenores aos quais os meus dedos inquietos não conseguem resistir. nos pseudo-pedaços de ti que tanto me inebriam que fico, por vezes, imóvel, plantada no meio da rua, absurdamente louca e ausente, a pensar-te ali. o vento do qual te escondes, eu acolho. a luz que te encandeia, procuro. sacodes as estrelas das tuas noites insones, e eu colho-as, uma por uma, fecho-as, quais flores secas, no que tenho de mais precioso - os meus livros - para que resplandeçam nos breves minutos de fuga antes de adormecer. eu sei que os dias passam, mas correm tão lentos. eu sei que o (meu) tempo existe (por, através de ti) mas flutua tão devagar. eu sei que respiras, mas estás demasiado longe. eu sei que és o meu caminho, mas temo ter perdido o mapa. traz-me as tuas mãos e guia-me pelo teu corpo.
"podemos amar no escuro, sim; podemos amar na luz sonâmbula da ausência, podemos tanto que inventámos Deus."
ou Deus inventou-te na ausência sonâmbula da minha luz e agora não consigo (vi)ver sem (ser por) ti.
[ excertos : Inês Pedrosa - Fazes-me Falta]
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