volto muitas vezes à tua rua. só que cada vez mais é cada vez menos a tua, a nossa rua. quero dizer-te tudo ao mesmo tempo e o que te quero dizer corre mais do que eu posso, corre muito mais do que eu quero. as tuas portas, sempre cor de morango maduro, a descascar, brancas como a cal que usavas no pátio, e o pátio, o pátio está verde como as folhas de louro que tinhas nos fios da roupa, e os fios da roupa, esses estão por um fio. e tentei espreitar para o pátio [rodei o trinco, e fez aquele barulho, sabes] e rodou, e abriu. e existe agora um cadeado prateado, esse bem reluzente, a segurar o portão. lembro-me de tudo menos do cadeado. e esse zomba agora, brilhante e forte, de tudo o que me lembro. e eu queria espreitar porque me sentia forte [não há maior fantasma do que o da ausência, e esse já o conheço], e queria espreitar porque me sentia pequenina [e faltava a tua mão na minha].
tenho cada vez mais medo de não ter nada mais do que memórias para transmitir.
tenho cada vez mais medo de não ter nada mais do que memórias para transmitir.
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